quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

TEATRO - Retorno para quem?


26/1/2011


Apesar das expectativas, alguns artistas e profissionais do teatro cearense questionam o custo financeiro da vinda de "Dionisíacas"

Entre cobranças e suspense, o espetáculo Dionisíacas finalmente aportou em Fortaleza, onde ocupa por quatro dias o Theatro José de Alencar. Alguns, no entanto, não receberam a notícia com satisfação - pelo menos após saber o valor necessário para trazer a produção de José Celso Correia e sua trupe, o Teatro Oficina.

Entre custos de deslocamento, montagem e cachê, "Dionisíacas" custará aos cofres estaduais cerca de R$ 600 mil. Um valor considerado "abusivo" por alguns artistas do teatro local, para uma única montagem.

Um deles é o ator Carri Costa, que, em carta aberta publicada no blog "CaririAgora!", protesta contra a soma destinada a Dionisíacas. Endereçada à "Sei lá a quem…a quem quiser" (uma das ironias relacionadas à carta aberta de Zé Celso, publicada no último dia 9, na qual ele cobra uma posição do Governo do Ceará sobre a vinda de "Dionisíacas"), a missiva argumenta que o valor poderia ser aplicado em ações voltadas ao teatro cearense - daria, por exemplo, para financiar 50 espetáculos de R$ 12 mil cada, ou ser aplicado na manutenção de grupos de todos os 181 municípios do Estado.

Ainda que em tom de humor rasgado (e bem cearense), a carta é afiada nas críticas. "Já imaginou 50 espetáculos montados pros 101 anos do Zé (TJA)? Gerando uma média de 800 empregos diretos, em torno de 2.500 indiretos? Dramaturgos, bailarinos, atores, iluminadores, coreógrafos, cenógrafos, técnicos, cantores, figurinistas…Uma porrada de gente colocando as contas em dia, atualizando a leitura, comprando Passecard...", brinca o ator no texto.

Antes da crítica, no entanto, Carri faz questão de destacar que o objetivo não é desmerecer o trabalho de Zé Celso. "Sou até fão do Zé! Adoraria vê-lo sempre por aqui com seus espetáculos. Mas pagar 600 mil reais não", enfatiza. Por telefone, o ator ratifica: "não somos contra a vinda de José Celso ou de nenhuma estrela do teatro. Também não quero dizer que ele não mereça esse valor. Minha crítica é que o dinheiro venha dos cofres público do Estado", explica. "Se o espetáculo viesse por meio de patrocínio privado, via lei de incentivo, era outra coisa."

Para Carri, os recursos públicos de um Estado não podem ser aplicados de maneira a privilegiar apenas o público da capital. "Se eu moro em Juazeiro e quero assistir a ´As Dionisíacas´ preciso pagar de novo, com transporte, além do que já saiu do meu bolso esses 600 mil", argumenta. "Falo como artista que mora aqui, que trabalha e construiu uma carreira aqui. É um investimento fora da nossa realidade". De fato, na carta o ator coloca um dado interessante: o montante necessário para trazer "Dionisíacas" "foi mais que o destinado pro teatro todin no Edital de Incentivo às Artes de 2010".

O ator ressalta ainda que seu objetivo não é criar polêmica, mas deixar clara sua postura "como pessoa que tem consciência em relação aos recursos públicos". "Na verdade, esse texto era uma mensagem que passei a alguns colegas do teatro e acabou sendo publicado. Algumas pessoas me apoiaram, concordaram, e fiquei muito feliz com isso. Outras não", revela.

Até o fechamento desta edição, o Caderno 3 tentou contato com o secretário da Cultura do Estado, Francisco Pinheiro, mas não obteve retorno sobre os questionamentos suscitados por Carri. Sob críticas e aplausos, "Dionisíacas" segue hoje à noite, dessa vez com apresentação da peça "Bacantes", sobre o nascimento e o renascimento do deus Dionísio. Com 5h30 de duração (incluindo dois intervalos), a peça está marcada para começar às 19h. Ingressos gratuitos distribuídos uma hora antes do início da peça.

ADRIANA MARTINS
REPÓRTER

FONTE:
Jornal Diário do Nordeste - Caderno 3

Nenhum comentário:

Postar um comentário